sábado, outubro 16, 2010


Brontossauros

Muita brutalidade. Muito machismo, muita discussão e muito pouco.
Onde é que estão os homens para puxar a cadeira, acender o cigarro, segurar o casaco ou abrir a porta do carro? Onde estão os homens que dão beijos na mão ao invés de beijar a boca ou qualquer outro lugar do corpo? Onde foram parar os homens de chapéu, charuto e bigode; charmosos, fumantes e bebedores de whisky caro?
Onde foram as conquistas, as rosas, os homens que correm atrás de um grande amor, que cantam na rua, que dançam na chuva, que fazem serenatas? Onde se meteram os homens que dão anéis, flores e caixas de bombons, que chegam em casa com um buquê de flores porque passar oito horas longe da esposa é tempo demais?
Cadê o sexo com amor, o beijo com sentimento, os telefonemas de madrugada só pra escutar a voz de alguém? Em que lugar foram parar as velas, os cheiros, os passeios de madrugada, o calor e o “proteger do frio”?
Então, que venham as gargalhadas, as noites abraçados, os sorvetes, as caminhadas, os campos, as flores, os amores. Que venham mais sentimentos marcantes, mais paixões arrebatadoras, mais vivência, mais convivência, mais entrega, mais abraços e menos, menos dinossaurismo, por favor.
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segunda-feira, outubro 11, 2010


Aqui se faz, aqui se paga

Estávamos discutindo a mais de uma hora. Eu não aguentava mais aquilo, era insuportável. Não havia nada de errado comigo, não sei porque ele insistia nessa bobagem ridícula de mudança e indiferença. Nós namorávamos desde os treze anos e, agora, ambos tinham vinte e quatro! Quem não mudaria nesse tempo todo? Sinceramente, eu não sabia o que a gente ainda fazia juntos. Era um saco, com o perdão do termo. As mesmas coisas, os mesmo lugares, as mesmas palavras, as mesmas desculpas, a mesma rotina. Isso. Já tinha virado rotina e, quando isso acontece, é porque o “encanto” acabou.
Queria sair correndo daquele lugar. A essas alturas, eu nem lembrava mais onde nós estávamos. Toda vez que começávamos uma discussão, eu tinha uma vontade louca de jogar ele na parede e socar a cara dele até ela explodir na minha mão. Precisava me controlar.
Viajei, saí de órbita, fugi. Enquanto ele ficava lá, com aquela conversa irritante que poderia ter sido evitada, eu me fingia de surda. Via a boca dele se movimentar, mas não escutava nada.

Eu vi uma rua movimentada, carros passando em alta velocidade, a boca dele ainda se movimentando e eu ainda sem escutar nada. Caramba, eu estava enlouquecendo e a culpa era dele. Não acreditava que, depois daquilo, eu iria precisar de uma psicóloga. Merda! Fiz o que me deu vontade de fazer. Queria isso há muito tempo. O empurrei na avenida, no meio de todos os carros e virei as costas. Ouvi buzinas, freadas e um estrondo. Não quis me virar para ver o que havia acontecido, eu já sabia o que iria ver se me voltasse para a rua. As pessoas gritavam, pediam socorro, mas eu estava bem, muito bem. Pensei: “devia ter feito isso antes, ou então, fazer mais vezes”. Eu não estava louca, pelo contrário, estava muito plena, quase pura.
Enquanto caminhava, escutei a ambulância chegando. Sorri, e rezei pra que fosse tarde. Empinei a bunda, levantei os peitos, arrebitei o nariz, ergui a blusa e desfilei estilo “patricinha de Beverly Hills”. Pra quem cruzava por mim, a ambulância e a confusão logo à frente não chamavam atenção. Aqui se faz, aqui se paga.

Ele me balançou, quase me bateu. Disse que eu não tinha prestado atenção em nada do que ele havia falado, e era verdade. Eu não tinha acordado completamente, ainda estava meio fora de mim, mas ele estava lá, e bem vivo. Droga! Nada de avenida, nada de carros, nada de buzinas, pessoas gritando ou ambulâncias. Sem mortes e sem satisfação. Doce ilusão...
Levantei do sofá, arranquei a aliança do meu dedo, joguei na cara dele e disse: “Vá se foder, por favor”.
Perfeito, quase a mesma sensação e eu não corria o risco de ir pra cadeia. Finalmente eu poderia viver onze anos de atraso.
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quarta-feira, outubro 06, 2010


Três Marias

Eu tinha duas. Duas insanas, duas piradas, duas de bem com a vida. Duas enlouquecidamente carentes e extremamente independentes. Dois brilhos, duas luzes, duas estrelas. Dois caminhos, dois espelhos, duas vidas. Duas Marias. Comigo, três.
Tem nome melhor? Marias. Além de abençoadas, inseparáveis.
A primeira: Maria Cristal. Límpida, lapidada, pura, cheia de faces, mas de um brilho só. Tão transparente, tão legível, tão enigmática. Cada passo calculado espontaneamente, cada sorriso forjadamente natural. Se existe alguém nessa vida com algum dom, eu acredito no dela: o da verdade. Uma Maria, quase nada sozinha.

A segunda: Maria Luna. Assim, bem lua mesmo, repleta de mudanças, crescentes e decrescentes. Tal como a lua interfere no mar em suas diferentes fases, essa Maria interfere em tudo. Nada se faz sem o sim ou o não da Luna. Tão completa, tão cheia de si, tão dependente, tão carente, tão nossa. Se existe alguém nessa vida com algum sentimento, eu acredito no dela: o amor. Incondicional, onipresente e constante. Duas Marias ainda não brilham no céu.

A última: Maria Galena. Tão evaporante, tão mutante, tão necessitada. Às vezes, sumida. Mas é a vontade de pensamento, de criatividade, de silêncio poético, de momentos. Irreverentemente apaixonada, perdidamente lúcida. Bipolar, depressiva, ouvinte, parapsicológica, conselheira e migratória. Se existe alguém nessa vida com amigas, eu acredito nas dela: as Marias. Assim, bem completas, bem juntas, “indescoláveis”, “indesgrudáveis”, donas de um só céu e de todas as direções. Três Marias.
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